terça-feira, 27 de agosto de 2013

Incêndios. Poluição é cancerígena e pode levar a 340 mil mortes por ano | iOnline

Incêndios. Poluição é cancerígena e pode levar a 340 mil mortes por ano | iOnline

O fumo emitido por fogos florestais é nocivo para ambiente e saúde pública. Em Portugal a investigação ainda é cara, morosa e escassa

Só por si trazem danos de sobra. Consomem milhares de árvores, destroem paisagens naturais e têm levado à morte de  bombeiros. Os hectares de floresta que todos os anos ardem em Portugal – este ano foram quase 31 mil até 15 de Agosto, segundo o Instituto de Conservação da Natureza e das Floresta – têm no fumo uma consequência esquecida. E logo a que carrega consigo um enorme impacto no aquecimento global e uma ameaça cancerígena para a saúde pública.
Em 2013 morreram já três bombeiros, foram detidos 42 incendiários e centenas de operacionais atravessam o país para ajudar no combate aos principais focos de incêndios (ver texto secundário), com uma verba estimada em 74 milhões de euros para combate a fogos e apenas 20 milhões para prevenção, segundo dados da Autoridade Nacional da Protecção Civil. Resta pouco espaço para preocupações ambientais devido ao fumo emitido por fogos florestais. Mas o seu impacto não é pequeno. Os incêndios “emitem grandes quantidades de dióxido de carbono (CO2) e contribuem muito para o aquecimento global”, explica ao i Célia Alves, do Centro de Estudos do Ambiente e do Mar (CESAM), da Universidade de Aveiro. A culpa está nos principais componentes detectados no fumo dos incêndios florestais: o tal CO2, o monóxido de carbono e o teor de hidrocarbonetos. Todos eles são nocivos para a atmosfera, segundo a investigadora, que participou no primeiro estudo realizado em Portugal sobre o impacto dos compostos orgânicos do fumo emitido por fogos florestais. Estas partículas, enquadrou Célia Alves ao i, “constituídas por material carbonoso”, vão “absorver ou dispersar a radiação “ e assim “alterar os padrões de temperatura”. O problema, afirmou a investigadora, existe e é conhecido, mas as “emissões resultantes dos incêndios encontram-se mal quantificadas e caracterizadas”.
340 mil mortes/ano Quanto à saúde pública, a investigadora do CESAM alerta para os riscos deste tipo de poluição: “Entre os compostos que analisámos foi detectada a presença de hidrocarbonetos aromáticos policíclicos”, nome de substância “altamente cancerígena”, e um de vários compostos “prejudiciais para a saúde humana”. Este tipo de partículas são “de natureza ultrafina” e “apresentam uma elevada capacidade de penetração nas vias respiratórias”. Em 2012, o primeiro estudo a calcular a mortalidade associada a incêndios florestais dizia que este fumo era responsável por quase 340 mil mortes por ano no planeta.
Em Portugal, apenas em 2009 começaram as recolhas de amostras de fumo, e só em 2010 foi publicado o primeiro artigo científico sobre este tipo de emissões.  A demora em estudar um problema reincidente a cada Verão que passa deve-se a um somatório de problemas: as dificuldades e os perigos de estar no terreno, adicionadas às restrições orçamentais para investir na área, resultam nos “entraves” criados na comunidade científica.
As dificuldades, enumerou a especialista, começam na “imprevisibilidade do espaço e do tempo” e na “perigosidade e na inacessibilidade” dos fogos, já que é necessário “correr atrás do fumo” para o recolher com “um motor de aspiração”, sendo necessária “autorização dos bombeiros”, que têm de acompanhar as equipas de investigação num processo que só pode decorrer “em incêndios controlados”. Outras técnicas, acrescentou Célia Alves, envolve “ensacar o fumo” para depois o submeter às análises laboratoriais.
Quanto a custos, a investigadora revelou que uma campanha de recolha de amostras efectuada em dois Verões consecutivos rondou os 100 mil euros. Dentro do laboratório, o obstáculo é a morosidade – cada amostra só obtém os primeiros resultados, em média, ao fim de dois meses.
Tudo em contraste com os meios utilizados, por exemplo, nos EUA. A semana passada noticiou-se que uma dupla de investigadores começou a sobrevoar, com helicópteros, áreas florestais onde estivessem a decorrer incêndios para recolher amostras de fumo. Arthur Sedlacek, um dos investigadores, contou ao i que o objectivo é “medir a composição dos diferentes aerossóis [gases com pequenas partículas, sólidas ou líquidas, suspensos no fumo]” para “desvendar o impacto do fumo no clima”. A recolha, prosseguiu o especialista norte-americano, também está a ser conduzida em fumo proveniente da queima de biomassa. Em Portugal, e além das dificuldades monetárias, este tipo de experiências seria impossível, pois “a utilização de voos para outros fins que não o combate aos incêndios é proibida”, sublinhou Célia Alves.

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