terça-feira, 23 de outubro de 2012

Bancos batem recorde de compra de dívida pública nacional. Empresas ficam sem crédito | iOnline

Bancos batem recorde de compra de dívida pública nacional. Empresas ficam sem crédito | iOnline

Nos primeiros oito meses os bancos aumentaram 32% a exposição à dívida pública. Crédito às empresas caiu 4,2%.

Os bancos a operarem no mercado português reforçaram o investimento em títulos de dívida pública nacional para um novo recorde de 30,3 mil milhões de euros, mostram os dados do Banco de Portugal ontem publicados. Ao todo, desde o início do ano, os bancos aumentaram a sua carteira de títulos de dívida soberana portuguesa em cerca de 32,6% (mais 7,5 mil milhões de euros). O aumento ocorreu em simultâneo com a dieta de crédito que a banca está a impor – em virtude dos objectivos indicativos da troika – e que resultou um recuo até Agosto de 4,2% (menos 4,8 mil milhões de euros) na carteira global de crédito às empresas.
Para especialistas ouvidos pelo i, as forças em jogo na crise portuguesa e da zona euro favorecem a criação deste cenário em que os bancos optam por não reciclarem pagamentos e financiamento recebido em novos empréstimos à economia privada, aplicando um valor cada vez maior em títulos de dívida soberana que oferecem uma relação risco/rendibilidade superior (uma boa parte a curto prazo) e a possibilidade de obter financiamento junto do Banco Central Europeu.
“Tem a ver com a necessidade de cumprir as metas de desalavancagem indicadas pela troika e, por outro lado, com a segurança e rentabilidade oferecida pela dívida pública”, afirma João Ferreira Marques, director-geral da Whitestar, uma empresa de recuperação de créditos.
O encaixe financeiro obtido com reembolsos de empréstimos e com financiamento externo (sobretudo do BCE) pode ser, grosso modo, usado pelos bancos para pagar dívidas, conceder novos créditos ou fazer aplicações financeiras. A concessão de novo crédito é restringida, por um lado, pela necessidade de cumprir as metas de desalavancagem – por outras palavras, a troika define uma diminuição dos empréstimos e um aumento dos depósitos (um reequilíbrio do rácio). O cumprimento deste reequilíbrio significa, por si só, uma queda do crédito concedido, quer aos particulares, quer às empresas.
Mas mesmo cumprindo as metas sobram recursos – e na hora de escolher os bancos têm privilegiado progressivamente mais as compras de títulos de dívida pública (ver gráfico). Com a economia interna em contracção profunda e o rácio de crédito malparado a atingir novos recordes (quase 10% do crédito concedido, segundo dados até Agosto), aumenta a aversão ao risco e a atractividade de activos de curto prazo que pagam bem ou de curto/médio prazo que permitam obter financiamento junto do Banco Central Europeu – esses activos são os títulos de dívida pública portuguesa.
Em Agosto a exposição global à dívida portuguesa aumentou para 30,316 mil milhões, um valor marginalmente maior face ao pico anterior de 30,305 mil milhões registado em Junho. A tendência global de subida tem sido forte. “São sobretudo compras de títulos em mercado secundário”, indica Filipe Garcia, economista da consultora financeira IMF. Nestas compras estão também títulos das emissões recentes feitas pelo Estado português.
Os bancos estão a substituir activos – se até à crise financeira mundial de 2008 era a economia privada que absorvia a maior parte do crédito, agora o bolo é muito mais partilhado com o Estado.
O recuo no crédito à economia – e as taxas altas praticadas nas operações realizadas (entre as mais elevadas da zona euro) – tem sido uma dos factores mais castigadores para a conjuntura e o emprego. As empresas portuguesas eram à partida para a crise as mais endividadas da zona euro – a redução da dependência face aos bancos feita ao mesmo tempo que o consumo privado cai a pique e está a eliminar muitos negócios orientados para o mercado interno (onde está concentrado mais de 75% do emprego total).
Os juros elevados nos empréstimos – explicados também pelo recuo dos financiadores habituais de Portugal (ver texto ao lado), fruto da dinâmica da crise do euro – são um obstáculo para a reconversão do tecido empresarial português para as exportações. Num relatório recente, o FMI identificou a política monetária favorável (juros baixos) como um dos factores críticos de sucesso para ajustamentos violentos como o de Portugal.

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