quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Ataque sem fim à vista aos rendimentos que não podem fugir ao fisco | iOnline

Ataque sem fim à vista aos rendimentos que não podem fugir ao fisco | iOnline

Gaspar não se compromete com futuro alívio fiscal. Apenas 9% dos agregados liquidam 73% do IRS – são estes o alvo.

Nas palavras do próprio ministro das Finanças é “um enorme aumento de impostos”. Depois de um buraco nos impostos sobre o consumo ter destruído os planos orçamentais do governo para 2012, Vítor Gaspar apresentou ontem uma bateria de aumentos de impostos que incidem directamente sobre rendimentos mais rígidos, ou seja, que não podem fugir ao fisco: salários (IRS), pensões (IRS) e património imobiliário (IMI).
A enorme receita adicional esperada – mais de dois mil milhões só no IRS – é muito superior ao que o governo tem que conseguir para devolver um subsídio de férias à função pública e aos pensionistas, o que sugere que servirá para corrigir parte do desvio orçamental de 1,6 pontos do PIB deste ano (que piora o ponto de partida para cumprir a meta de 4,5% em 2013) e compensar mais uma quebra dos impostos sobre o consumo no próximo ano.
O governo vai devolver aos funcionários públicos um dos dois subsídios retidos este ano, sendo que os pensionistas receberão 1,1 subsídios. Com este passo o governo espera respeitar o acórdão do Tribunal Constitucional, que ilegalizou uma estratégia de austeridade orçamental centrada nestes grupos de pessoas. O efeito líquido da devolução das prestações acrescenta cerca de mil milhões de euros à despesa pública em 2013.
Para compensar o governo vai aumentar violentamente a pressão em sede de IRS. Por um lado, haverá uma sobretaxa extraordinária de 4% que, explicou Gaspar, deverá ser aplicada “nos moldes idênticos a 2011” – ou seja, será aplicada sobre um dos subsídios (férias ou Natal), implicando um perda, grosso modo, de cerca de 57% da prestação.
A somar à sobretaxa, o ministro confirmou a redução do número de escalões do IRS, de oito para cinco. “As alterações do IRS foram calibradas por forma a conseguir um aumento significativo da progressividade do imposto”, explicou Gaspar. Por outras palavras: quem declara mais, pagará proporcionalmente mais. As pessoas abaixo do mínimo de existência vêem a situação inalterada.
Tendo em conta que a sobretaxa em 2011 rendeu cerca de mil milhões de euros e que Gaspar espera para 2013 uma receita adicional de IRS “certamente superior a dois mil milhões de euros”, o efeito da progressividade na fusão de escalões terá que ser muito forte.
“Sem mais informação não é possível fazer as contas, mas a medida afectará mais as pessoas no segundo escalão [66 mil a 153 mil euros brutos por ano] e no terceiro [61 mil a 66 mil euros brutos]”, avança Sérgio Vasques, fiscalista e professor na Universidade Católica.
9% das famílias aguentará o peso O agravamento poderá apanhar valores ainda mais baixos, uma vez que o IRS já é muito progressivo em Portugal. Segundo os dados mais recentes das Finanças (de 2010), 73% da receita liquidada em sede de IRS é paga por apenas 9,3% dos agregados familiares que entregam a declaração – em 2010 eram os agregados com rendimento anual bruto superior a 40 mil euros (a maior fatia vem do intervalo entre 50 mil e 100 mil euros brutos por ano).
É sobretudo sobre estas pessoas – classe média e média alta num país com salário médio de 800 euros – que cairá a nova fúria fiscal que, em conjunto com a sobretaxa de 4%, deverá significar a perda de mais do que um salário inteiro em 2013. Juntando os dois agravamentos a taxa média de efectiva de IRS sobe de 9,8% para 13,2% explicou ontem o ministro das Finanças.
A maioria das pessoas (83%) que liquida pouco ou nada no IRS poderá ficar ligeiramente melhor do que com o corte de 7% inicialmente programado com a maior retenção na fonte dos encargos sociais (TSU), admitiu Vítor Gaspar (isto se não forem proprietárias da casa onde vivem – ver página 20).
Para perceber de forma exacta como a revisão dos escalões afectará de forma específica as pessoas é preciso esperar pela apresentação da proposta de Orçamento do Estado no próximo dia 15, indicou o ministro das Finanças. A única certeza é de que no escalão mais alto (actualmente acima de 153 mil euros) a taxa máxima de IRS subirá para 54,5%, ultrapassando pela primeira vez a barreira dos 50% (actualmente é de 46,5% mais uma contribuição de 2,5%).
Cheque em branco? O ministro das Finanças admitiu duas vezes que o aumento dos impostos é “enorme”, mas não quis comprometer-se perante os contribuintes com um calendário de redução da carga fiscal no futuro – nem sequer no caso da sobretaxa extraordinária de 4%. “Este enorme aumento de impostos não durará para sempre, será diminuído ao ritmo que conseguirmos reduzir a despesa pública”, afirmou Vítor Gaspar. “Não é vantajoso assumir calendários específicos”, acrescentou.
O ministro garantiu ontem que a redução da despesa valerá 57% da consolidação do défice nos próximos dois anos – mas excluiu destas contas a devolução (contabilisticamente relevante) de um dos subsídios. Para já, o governo continua sem detalhar onde e como quer cortar nos gastos em 2013 e em 2014 – segurança social será um alvo prioritário, identificou ontem Gaspar.

Nenhum comentário:

Postar um comentário