quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Governo avança na racionalização de medicamentos e exames | iOnline

Governo avança na racionalização de medicamentos e exames | iOnline

O governo já mandou executar o parecer da Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida (CNCEV), que no final de Setembro lançou o debate público em torno do racionamento em saúde. A instruções foram dadas ao Infarmed, à Direcção-Geral da Saúde e às administrações regionais de Saúde através de um despacho, que ainda não é público. Além de as normas clínicas terem de passar a ser mais “explícitas” nos critérios para sugerir remédios ou exames, a racionalização na área do medicamento passará por ressuscitar um modelo antigo e ainda por criar um novo: listas orientadoras a usar nos hospitais do SNS – que já existiam mas estavam praticamente em desuso desde 2006 –, mas também nas receitas comparticipadas que os portugueses aviam nas farmácias.
Fonte oficial do Ministério da Saúde adiantou ao i que não está em causa racionamento clínico nem a interferência em opções de carácter terapêutico: os médicos têm liberdade de prescrição. Como as listas deverão abranger a generalidade das situações, poderão pedir a excepção quando considerem ser necessário usar um medicamento que não surge nestes formulários, algo que já acontecia quando o formulário hospitalar nacional de medicamentos (FHNM) era utilizado nos hospitais, confirmou o i. O bastonário dos médicos, que não quis comentar a decisão, uma vez que o despacho não é público, referiu que, pelo menos a nível hospitalar, o formulário não levantava obstáculos aos médicos.
Recorde-se que o parecer do Conselho de Ética foi mal recebido no sector, depois das declarações iniciais do presidente do CNCEV. Desde então tem havido algum consenso quanto à possibilidade de maior racionalização na prescrição, desde que sejam cumpridas as orientações clínicas nacionais e internacionais e que isso não implique um racionamento por idade ou não vede o acesso a remédios que os médicos considerem vitais. Foi, contudo, por aí que começou o debate em torno do parecer. Na manhã em que se soube da existência do documento, o presidente do conselho disse à Antena 1 que o racionamento em saúde “não só é legítimo como, mais que isso, é desejável”. Oliveira e Silva incendiou a discussão: “Será que mais dois meses de vida, independentemente dessa qualidade de vida, justificam uma terapêutica de 50 mil, 100 mil ou 200 mil euros? Tudo isso tem de ser muito transparente e muito claro, envolvendo todos os interessados.”
Perdido no tempo Portugal foi pioneiro na criação do formulário hospitalar nacional de medicamentos, há 30 anos. Hoje este sistema existe, por exemplo, na Suécia ou no Reino Unido. Selecciona remédios a utilizar preferencialmente nos tratamentos financiados pelo Estado entre todas as moléculas disponíveis no mercado. Algumas podem ser redundantes ou similares e ter preços mais elevados sem mais-valias terapêuticas.
Este modelo foi usado nos hospitais portugueses até 2006, data da última edição do formulário. No mesmo ano foi introduzida nova legislação, que obriga todas as novas moléculas para uso hospitalar a passarem por uma avaliação prévia de custo-benefício. Este novo mecanismo, associado ao facto de a comissão que gere o FHNM não ser alterada há largos anos, fez que o formulário deixasse de ser actualizado para incluir novas entradas de remédios ou eliminar opções antigas.
Num esclarecimento ao i, o Ministério da Saúde disse ontem que é esta base que será retomada, remetendo para o prefácio disponível na internet. “É um texto orientador que traduz a escolha selectiva perante uma larga oferta de medicamentos, de valor variável, e muitas vezes resultante apenas de uma indústria comercialmente agressiva”, lê-se. O documento ressalva ainda que o modelo “não é, contudo, um instrumento coercivo da prescrição, pois a não inclusão de determinado medicamento é sempre passível de correcção”.
Alargar este modelo ao ambulatório é a novidade. Já tinha sido proposta pela Ordem dos Farmacêuticos, que entende que com esta lista a aquisição dos remédios comparticipados e aviados nas farmácias poderia ser feita por concurso público, com menos encargos para os cofres públicos. O Estado já discrimina remédios através do regime de comparticipações, pelo que fontes do sector entendem que este processo deverá ser acompanhado pela revisão deste regime.
Questionado pelo i à saída da comissão de Saúde, o ministro Paulo Macedo negou que a adopção da proposta do Conselho de Ética signifique alargar a nível nacional o modelo adoptado por 14 hospitais do Norte, que seleccionou listas de remédios por patologia para racionalizar a aquisição mas tem sido acusado de racionamento. O i sabe contudo que o resultado final deste processo será semelhante ao das listas criadas pelas comissões terapêuticas dos hospitais do G14, sendo o objectivo que estas resultem de uma discussão mais ampla entre especialistas e sejam adoptadas a nível nacional – as listas do G14, por exemplo, deixam de ser aceites.
O ministro da Saúde disse ontem no parlamento que pediu o parecer ao conselho por estar preocupado com a equidade dentro do sistema. Só no final das quase quatro horas da audição o secretário de Estado revelaria que o processo de implementação estava já em curso. “Afirmar a necessidade da existência de formulários actualizados não se confunde com a defesa do racionamento de cuidados”, disse ontem ao i o Ministério da Saúde. Os formulários irão reforçar o processo de elaboração e auditoria das normas clínicas, que segundo o novo despacho deverão passar a ser mais explícitas na justificação das opções em termos de medicação e exames que nos últimos meses têm sido recomendas por peritos da Direcção-Geral da Saúde e Infarmed para cada doença.
"De orçamentos ainda percebo", diz Macedo
Foi um dos momentos insólitos de ontem na comissão de Saúde. A deputada do PCP Paula Santos questionou o ministro sobre os contornos da redução orçamental na saúde para 2013 quando Paulo Macedo levantou a mão a disse para arrumar o assunto: “De orçamento ainda percebo.” O ministro irá ao parlamento a 5 de Novembro só para discutir este tema com os deputados. Macedo, indicado como possível sucessor de Gaspar nas Finanças, escusou-se a discutir a proposta do OE. No final da audição avançou ainda assim que a reposição de subsídios, o acordo com médicos e novas entradas previstas para 2013 terão um peso de 300 milhões de euros, o que baixa o orçamento operacional do SNS para além do patamar dos 8 mil milhões de euros.

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