segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Em Belém, há um deserto de responsabilidades | iOnline

Em Belém, há um deserto de responsabilidades | iOnline

Governo e autarquia não avançam com diálogo para apurar responsabilidades sobre destruição de Jardim Vasco da Gama.

Quase três anos após a destruição dos jardins de Belém, e com o primeiro ano de funções executivas cumprido, o governo continua sem disponibilidade para dar uma resposta a este problema. Da parte da Câmara Municipal de Lisboa, a postura é de expectativa face a novidades do gabinete do primeiro-ministro, onde está o dossier sobre o assunto. Em causa está, desde o início, a responsabilidade sobre quem deve pagar a factura do novo sistema de rega, um investimento que a autarquia estimou em perto de meio milhão de euros, de acordo com um estudo elaborado entretanto.
Em Novembro de 2009, os responsáveis políticos europeus reuniram-se num palco montado em pleno jardim Vasco da Gama, numa tenda com vista para a Torre de Belém, para assinalar a entrada em vigor de um documento tido como fundamental para o futuro da União Europeia. Então aos comandos do país, José Sócrates era o anfitrião da cerimónia que marcava o início de vida do Tratado de Lisboa. Tinham passado dois anos sobre a assinatura do documento, que se realizou a um quilómetro dali, no Mosteiro dos Jerónimos, e pelo caminho tinham também ficado as dificuldades com que alguns países se depararam para conseguir ver aprovado pelos eleitores o novo texto europeu. Dias antes, no mesmo local de Belém, responsáveis políticos de outras geografias tinham-se encontrado para a XIX Cimeira Ibero-Americana.
jardim de terra Assim que se levantaram as estruturas da tenda, o problema tornou-se evidente: o sistema de rega que servia uma área de centenas de metros quadrados de relva estava destruído. Em poucos dias, o manto verde – que rodeava a Torre de Belém e a réplica do avião com que Sacadura Cabral e Gago Coutinho ligaram os continentes europeu e americano, em 1922 – deu lugar a um manto castanho. “A última vez que estive em Lisboa foi há seis anos. Hoje, quando aqui cheguei, vi um espaço triste, muito diferente daquele de que me lembrava”, diz uma turista espanhola, na sua segunda visita a Belém.
Os autocarros continuam a chegar lotados, uns atrás dos outros, para estacionar na margem do rio Tejo. Atraídos pelo monumento seiscentista, os turistas não abdicam das visitas a um dos principais marcos da construção manuelina. Sentada nas raízes salientes de uma árvore, Juliana passa os olhos pela zona em volta enquanto espera pelo marido. Está pela primeira vez em frente à Torre, mas o discurso é idêntico ao de quem conhece o local de outras passagens: “Dá a sensação de que o espaço foi abandonado. Não é bem a imagem que esperava encontrar”.
responsabilidades Há dois lados em confronto nesta história. De um lado, a autarquia da capital. Há três anos, o presidente António Costa cedeu o terreno em frente à Torre para que as duas cerimónias se pudessem realizar. Depois de se deparar com o estado em que ficaram os jardins, a autarquia, pela voz do vereador José Sá Fernandes (com os pelouros do Ambiente Urbano, Espaços Verdes e Espaço Público), iniciou os contactos com o gabinete de José Sócrates, por considerar ser o governo responsável pela requalificação do espaço.
Do outro lado está, naturalmente, o executivo. Primeiro socialista, agora em coligação PSD-CDS/PP. Quer no que restou do mandato de José Sócrates, quer no último ano de governação de Pedro Passos Coelho, pouco foi feito para apurar quem deve avançar com a substituição dos sistemas de rega de Belém. “Temos estado em contacto regular com o governo”, garante Sá Fernandes, que diz esperar “para breve” uma solução. No entanto, as conversas entre as duas partes interessadas na matéria pouco avançou em três anos. A câmara de Lisboa espera actualmente que o governo nomeie um representante para que, em conjunto, seja possível chegar a uma conclusão sobre quem deve, afinal, pagar a factura.
A somar à dificuldade de autarquia e governo chegarem a acordo poderá estar o facto de, no dia 11 de Abril deste ano, ter sido declarada a insolvência da empresa Alfasom – Sonorização e Audiovisuais, no Tribunal de Sintra. Precisamente a mesma empresa que, no seu site, se apresentava como responsável pelo palco montado para a cimeira Ibero-Americana de 29 de Novembro de 2009, que contou com a presença de vinte líderes políticos internacionais.
Na publicação do anúncio em “Diário da República”, ficava expresso o prazo de 30 dias para que fossem reclamados créditos à empresa. Uma acção que, até ao momento, não é garantido que o governo tenha efectuado.
Durante vários dias, o i tentou obter esclarecimentos junto do gabinete do primeiro-ministro sobre esta questão, mas também saber quais as previsões para a nomeação de um árbitro para o Tribunal Arbitral, saber se estavam previstas no contrato firmado entre o governo e a empresa promotora responsabilidades sobre danos resultantes da instalação dos equipamentos e, ainda, saber as razões para que, durante o último ano, o processo não tivesse avançado. Do gabinete de Pedro Passos Coelho não houve, até ao fecho desta edição, disponibilidade para responder às questões colocadas.

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