quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Comércio justo. A crise torna os portugueses menos solidários | iOnline

Comércio justo. A crise torna os portugueses menos solidários | iOnline

Pagar mais por um produto que contribua para uma economia em desenvolvimento? Só 12% dizem sim.

Está disposto a pagar mais? Não surpreende que os portugueses fujam da pergunta como o Diabo da cruz, mas se a conjuntura fosse a única explicação seria de esperar o mesmo de gregos ou de espanhóis. Desta vez o objectivo da pergunta era perceber como anda a predisposição dos europeus para pagar mais por alimentos ou outros produtos provenientes de países em desenvolvimento se isso ajudar as populações desses países. Só um em cada dez portugueses respondeu que sim, o pior indicador da Europa. Na Grécia e em Espanha este tipo de solidariedade ainda levaria mais de um terço das pessoas a abrir a carteira.
O retrato surge num eurobarómetro publicado ontem sobre ajuda aos países em desenvolvimento. A análise compara respostas de 26 mil pessoas recolhidas em Junho com um inquérito de Setembro de 2011. Portugal está entre os países onde a predisposição para a solidariedade, sendo ainda valorizada pela maioria das pessoas, mais se esbateu durante este intervalo de nove meses em que a crise económica parece ter ficado mais longe do princípio do fim e encolheram os rendimentos das famílias.
A questão dedicada à predisposição para gastar mais optando, por exemplo, por produtos do chamado comércio justo revela uma das maiores retracções dos portugueses: no inquérito do ano passado, 23%, ou seja, perto de um quarto da população, estaria ainda disponível para pagar mais 5%, 10% ou até mais por um determinado cabaz se isso contribuísse para ajudar um país pobre. Agora só 12% se mostram receptivos e a percentagem dos inquiridos sem a menor predisposição para pagar mais subiu de 73% para 83%. O apertar do cinto parece estar a afectar toda a Europa: 52% estão indisponíveis para pagar mais, mais 5% que em 2011.
No fundo da tabela, Portugal não está no mesmo patamar dos países alvo de resgate, mas ao nível do Leste da Europa: na Bulgária 78% também rejeitam usar a lista de compras para ajudar os países em desenvolvimento se isso significar pagar mais, seguindo-se a Letónia e a Roménia. Holanda e Suécia são os países mais solidários: apenas um quinto da população não está disponível.
Os eurobarómetros destinados a monitorizar percepções da solidariedade internacional repetem-se anualmente desde 2009 e surgiram mais uma vez este ano a pedido da Direcção-Geral para o Desenvolvimento e a Cooperação da Comissão Europeia, que tem vindo a procurar formas de calibrar as estratégias de apoio público em função das vontades colectivas. A maioria dos europeus continua a considerar importante apoiar os países em desenvolvimento, embora aqui Portugal revele mais uma vez a maior quebra registada nos últimos nove meses: em Setembro 88% dos portugueses consideravam importante este tipo de ajuda e hoje o consenso nacional é o quinto menos expressivo dos 27 países que participam no eurobarómetro: só 78% valorizam este apoio. Na Suécia, na Dinamarca, na Alemanha e na Polónia a solidariedade com os países em desenvolvimento é considerada importante por nove em cada dez pessoas.
Para que serve? Se o apoio aos países em desenvolvimento é consensual – embora cresçam as reticências em relação à ajuda a países pobres –, o desconhecimento sobre o destino dado às ajudas públicas é evidente. Em cinco países, entre os quais Portugal, mais de 60% das pessoas não têm a menor ideia de quais os objectivos e resultados das ajudas bilaterais encetadas pelos seus países.
No extremo oposto, holandeses, dinamarqueses e finlandeses são os mais informados – oito em cada dez habitantes estão a par do destino das verbas nacionais alocadas ao desenvolvimento de países terceiros. Os relatórios da OCDE serão um bom ponto de partida para mais informação. A última publicação referente a Portugal, de 2010, revela que o país tem falhado nos compromissos assumidos no plano da ajuda internacional: o objectivo seria, até 2015, cada estado-membro da UE alocar anualmente ao apoio ao desenvolvimento 0,7% do rendimento nacional produto. Portugal tem ficado abaixo dos 0,3%, meta que deveria ter sido ultrapassada em 2006. Em 2009, no início da turbulência, a ajuda internacional proveniente de Portugal caiu de 475 para 388 milhões de euros.

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