quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Cirurgias caem em 60% dos hospitais públicos | iOnline

Cirurgias caem em 60% dos hospitais públicos | iOnline

Falta de especialistas é a resposta consensual. Unidades admitem aumento no tempo de espera.

A maioria dos hospitais públicos fizeram menos cirurgias até Julho do que no mesmo período de 2011. Embora ainda não seja conhecido o ponto de situação das listas de espera no Serviço Nacional de Saúde, os hospitais com as maiores quedas que o i conseguiu contactar admitem o agravamento em algumas especialidades. A falta de médicos anestesiologistas é uma das explicações invocadas pelos conselhos de administração.
Os dados sobre a actividade cirúrgica nos hospitais são divulgados mensalmente pela Administração Central do Sistema de Saúde. Num balanço nacional registou-se até Julho um aumento de 4,7% nas cirurgias programadas (mais 14 621 operações) e uma diminuição de 0,7% nas cirurgias urgentes (menos 412). No entanto, uma análise individual dos hospitais mostra que a tendência de subida nas operações não representa a maioria das unidades, pelo contrário. Entre as 38 unidades (de um total de 48) com informação comparável com 2011, 23 registavam até Julho quebras que vão de variações residuais a descidas abruptas, como é o caso da actividade na Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo (-20,48%) ou no Centro Hospitalar Oeste Norte (-26,12%).
O i procurou saber junto das unidades onde há maiores descidas quais os motivos, se existe um aumento dos tempos de espera ou, por outro lado, se estão a ser encaminhados mais doentes para clínicas privadas ou do sector social. Através do Sistema de Gestão dos Utentes Inscritos para Cirurgia (SIGIC), os casos em que os hospitais públicos de origem não conseguem dar resposta no tempo previsto na lei são encaminhados para outros hospitais do SNS ou unidades privadas ou sociais convencionadas.
Este ano há duas alterações nesta logística, cujo impacto ainda não foi medido. Os hospitais passam a ter de pagar do seu orçamento os vales que permitem aos doentes ser operados mais depressa noutras instituições, um incentivo à eficiência que poderá chocar com o facto de terem visto os orçamentos globais reduzidos. Por outro lado, a ACSS definiu que os hospitais de origem podem encaminhar doentes para outros hospitais da rede pública após quatro meses de espera, fazendo-se o encaminhamento para os convencionados a partir de seis meses. Sem invocarem estas razões, a falta de recursos humanos é consensual.
O Centro Hospitalar Barreiro Montijo, com uma quebra de 9,9% nas cirurgias (menos 319 operações), refere como explicação a saída de urologistas, oftalmologistas, cirurgiões gerais e ortopedistas para outros hospitais ou para a reforma, garantindo que a diminuição da actividade não está relacionada com restrição na compra de material. O hospital adianta que tem aberto concursos para pessoal e que, para já, o tempo médio de espera só se agravou nas especialidades em que perderam médicos, tendo reduzido nas restantes.
Já o Instituto de Oftalmologia Dr. Gama Pinto, em Lisboa, diz que a consequência da falta de pessoal é mesmo o agravamento dos tempos de espera, ainda que nunca tenham ultrapassado os prazos que levam a enviar doentes para fora. Nesta unidade, o tempo médio de espera piorou 31 dias: em Julho eram 86 dias de espera e no ano passado 55. A lacuna em médicos anestesiologistas é a mais crítica, agravada pela lei dos compromissos e um despacho do ministro das Finanças, de 12 de Setembro, que impede contratações de serviços médicos entre outras prestações de serviços. O instituto tem dois e precisa de outros dois para ter a funcionar as quatro salas do bloco operatório. Como os concursos para colocação de especialistas têm ficado “desertos”, resta a contratação externa, agora suspensa.
A dificuldade em contratar anestesiologistas é também invocada por Pedro Nunes, presidente do conselho de administração do Hospital de Faro, onde as cirurgias caíram 18,7%. Precisam de 14 e só conseguiram contratar um – haverá novo concurso no final do mês. Para a quebra de cirurgias, que o responsável diz não representar aumento dos tempos de espera, contribui também uma mudança ao nível da gestão, que faz com que haja mais doentes encaminhados para fora. Antes algumas cirurgias eram feitas num regime em que alguns médicos do hospital ou contratados para prestação de serviços recebiam à peça por fazer mais operações além das previstas, para dar vazão às listas. “Criava-se uma desigualdade dentro do hospital, às vezes com médicos a vir de fora para ganhar muito mais.” Embora as contas do hospital saiam penalizadas em 10% por cada cirurgia que enviam para fora, Pedro Nunes defende que houve a opção para corrigir a “desregulação dos últimos anos”.

Nenhum comentário:

Postar um comentário