segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Tribunal deu razão a trabalhador da CGD que denunciou chefias - Economia - PUBLICO.PT

Tribunal deu razão a trabalhador da CGD que denunciou chefias - Economia - PUBLICO.PT

A administração de Carlos Santos Ferreira considerou que o trabalhador que fez denúncias estava a atentar contra a "idoneidade" de funcionários com "cargos de elevada responsabilidade" e suspendeu-o.

O Tribunal Central Administrativo do Sul acaba de decretar que a CGD terá de "apagar" dos registos da instituição uma acção disciplinar que condena a uma pena de suspensão sem vencimento um dos vários trabalhadores que denunciou práticas de escutas telefónicas ilícitas, uso abusivo de bens públicos, compadrio e branqueamento de actos ilegais cometidos por quadros de topo da instituição. A administração de Carlos Santos Ferreira concluiu que Fernando Luís Santos Murtinheira estava a atentar contra a "idoneidade" de funcionários com "cargos de elevada responsabilidade".

Este é apenas mais um caso, entre outros, que têm sido reportados por trabalhadores afectos aos serviços centrais da CGD, sobre alegados actos de vigilância abusiva por parte de responsáveis do grupo que estão, ou estiveram, ligados ao Gabinete de Prevenção e Segurança (GPS).

O PÚBLICO noticiou na semana passada (27/9) que o actual director do GPS, Nuno Bento, beneficiou, em 2011, de três créditos polémicos [800 mil euros, metade a spread 0%). E foi ainda constituído arguido, a 27 de Agosto de 2012, depois de uma colaboradora, do seu departamento, apresentar queixa por violação de correspondência privada.

Já o episódio envolvendo Fernando Murtinheira, ex-quadro do GPS, remonta a 6 de Fevereiro de 2008, quando foi punido com uma "pena disciplinar de 180 dias de suspensão de exercício e vencimento". Murtinheira recorreu para o TCA. A sentença foi conhecida a 20 de Setembro de 2012 e é explícita: a CGD terá de "eliminar do processo individual" do trabalhador "qualquer referência" à decisão disciplinar, bem como anular o castigo que aplicou. O banco deve "publicar" o acórdão do tribunal, "pela mesma forma e com a mesma amplitude", com que difundiu, em 2008, junto dos trabalhadores, a acção disciplinar.

Na nota disciplinar, Francisco Bandeira sustenta a sanção a Murtinheira com o facto de este ter formulado "acusações, insinuações e afirmações graves sobre a idoneidade pessoal e profissional de empregados que ocupam cargos de elevada responsabilidade na CGD". E consideradas "atentatórias do bom nome, honra, consideração e brio profissional dos mesmos, que se apurou serem infundadas, levianas, despropositadas e gratuitas". O TCA condenou a CGD "a restituir" a Murtinheira "o montante global que tiver deixado de pagar-lhe a título de execução da deliberação em causa, a liquidar em execução da sentença, acrescido de juros à taxa legal até efectivo e integral do pagamento."

Num email enviado ao PÚBLICO, a CGD nota que "as sanções disciplinares são sempre passíveis de contestação através de acções disciplinares", e que "os tribunais podem dar razão ao empregado ou à empresa, quer se trate de sanções expulsivas ou correctivas". Já a situação em causa "não é diferente de qualquer outra, independentemente dos factos levados à acusação e da apreciação que o tribunal fez dos mesmos". José Matos, presidente executivo do banco, assegura que "cumprirá, como é do seu dever, com as decisões do tribunal".

Ao PÚBLICO Francisco Bandeira garantiu desconhecer a sentença do TCA, que resulta numa desautorização de uma deliberação assinada por si. Explicou: "A decisão da administração foi colegial, e era preciso publicitá-la em ordem de serviço, que só podia ser assinada pelo presidente ou pelo vice-presidente." A equipa liderada por Santos Ferreira integrava, em 2007/8, Rodolfo Lavrador e Norberto Rosa, actuais administradores executivos.

Por seu turno, Murtinheira contou que foi depois de escrever ao ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, "a falar de compadrio e de branqueamento de factos ilícitos por parte de altos quadros da CGD", que o processo disciplinar contra si foi desencadeado. Isto porque o ministro "inquiriu a CGD." "Mas antes tinha enviado também uma carta à administração a relatar factos detalhados, como escutas telefónicas abusivas, clonagem de equipamento feito por Nuno Bento, e até peculato de bens públicos, por actuais directores do banco. Mas não ligaram."

Em Dezembro de 2011, o Correio da Manhã noticiou que o GPS tinha sido alvo de uma inspecção, em 1999, que produziu um relatório "explosivo". O documento só foi conhecido ao fim de 12 anos, e aponta para suspeitas de corrupção, peculato, coacção, escutas telefónicas e por vídeo envolvendo actuais responsáveis do banco. O relatório consta de um outro processo, a correr desde 2011 no Tribunal Administrativo de Sintra, e colocado por Amador Ribeiro. Meses depois, em Março de 2012, Murtinheira entregou no DIAP de Lisboa nova queixa-crime, sustentada nesta prova: "Estou à espera que me chamem para depor."

No epicentro destas polémicas está o GPS, que chegou a ser encerrado em 2000. Cinco anos depois, quando assumiu funções de vice-presidente, Armando Vara ordenou a sua reactivação e indicou para director Nuno Bento, um dos visados no documento "explosivo" que levara à extinção do GPS.

"Já questionei pessoalmente a Comissão Nacional de Protecção de Dados sobre se a CGD, alguma vez, desde 1998, solicitou autorização para adoptar o actual esquema de vigilância seguido pelo GPS, e que o contrato de trabalho não prevê. Disseram-me que nunca o tinha feito. E mesmo que tivesse, a resposta seria negativa", explicou João Lopes, líder do Sindicato dos Trabalhadores das Empresas do Grupo CGD. "Tal como as anteriores, esta gestão está informada, e também não actua. Não percebo. Há algo que os impede."

Para além de Nuno Bento, Henrique Melo, director central de Pessoal, e Serafim Amorim, director central da Caixa de Previdência de Aposentações do grupo, estão, igualmente, no centro das polémicas e os seus nomes constam de acções judiciais. Nenhum esteve disponível para falar com o PÚBLICO. Outro dos mencionados nas queixas-crime é José Luís Tavares de Andrade, que chefiava o GPS em 2000 (Bento era o número dois), de onde saiu por quebra de confiança. Acabaria por transitar para outras empresas do grupo estatal, estando agora ligado aos HPP. Em 2001, Tavares de Andrade juntou-se a Bento e a José Fontes de Melo (do Núcleo de Informática Departamental do GPS) para criar uma empresa de consultoria. Em 2005, Bento informou a CGD que vendera a sua quota.

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