segunda-feira, 29 de outubro de 2012

30.º km. Governo quer refundar programa para reduzir Estado social | iOnline

30.º km. Governo quer refundar programa para reduzir Estado social | iOnline

A partir de agora e até ao período crítico da maratona, o governo quer redefinir o Estado.

Na maratona, o chamado muro é psicológico e físico ao mesmo tempo. A partir do quilómetro 30 as pernas falham, as cãibras aparecem, a desidratação começa a dar sinais. O fígado e os músculos já queimaram as reservas de glicogénio e a quebra de energia é súbita e poderá levar à desistência. Será nessas condições (ou piores) que Portugal vai chegar ao mês de Fevereiro e à sétima avaliação da troika onde os cortes na despesa estrutural serão o maior desafio à execução do programa. Será aí que já serão conhecidos alguns contornos da “refundação” do programa, prometida por Passos Coelho, e a definição das funções do Estado. Sem nenhum posto de abastecimento para combater a desidratação no horizonte, conseguirá Portugal perder mais energias e mesmo assim ultrapassar o muro da maratona do Memorando?
Vítor Gaspar usou a imagem da maratona para dizer que Portugal está no 27º km da prova do ajustamento. Lembrou que não é ao quilómetro 27 que os atletas normalmente desistem, mas sim entre o 30º e o 35º. E o que espera o governo nesse período crítico? Nem mais nem menos do que: (1) a barreira psicológica dos resultados da execução orçamental do primeiro trimestre do ano que vão dar uma visão do comportamento da receita (principalmente do IRS) e da despesa (sobretudo prestações sociais); (2) a revisão ordinária do Programa de Estabilidade e Crescimento; (3) duas importantes avaliações do programa (sétima e oitava).
O governo vai ter de aguentar até ao final do quilómetro 35 para esperançar pelo primeiro abastecimento de água, fruta ou do gel energético ou, na semântica do ajustamento, financiamento nos mercados. Logo a seguir ao período de perigo, Gaspar enfrenta o teste decisivo do regresso de Portugal aos mercados da dívida. Este pode ser o momento de hidratação ou de desistência. É que logo a seguir há mais um teste, mas político: as eleições autárquicas de 2013 que acontecem quase em simultâneo com a discussão do Orçamento para 2014.
Reforma do Estado Objectivo número um: delinear um plano, no curto prazo para reduzir a despesa estrutural do Estado em pelo menos quatro mil milhões de euros até 2014. Será a maior prova de desgaste para um governo que passou por uma grave crise entre os dois partidos que o compõem por causa, exactamente, do equilíbrio entre corte na despesa e aumento de impostos no OE 2013. Desta vez, escolheram o adversário comum e estão unidos na batalha de pedir ao PS que se junte ao governo para redefinir as funções do Estado (ver páginas 20/21).
O plano tem de começar a ser desenhado já na sexta avaliação da troika. Mas como cortar quatro mil milhões e não tornar o Estado num Estado mínimo? O grande peso da despesa prende-se com as funções sociais (Saúde, Educação e prestações sociais) e com os gastos com pessoal (pagar a professores, médicos, polícias, militares e restantes funcionários do Estado). Esse é o debate que tanto PSD como CDS querem fazer, mas estarão de acordo nas linhas gerais do que deve ou não ser cortado? É aí que vai começar o verdadeiro teste à resistência do governo, uma vez que essa discussão se faz quase ao mesmo tempo da apresentação dos dados da execução orçamental do primeiro trimestre. E se é certo que o CDS aprovará o OE, vai fazê-lo a contragosto por ter tido de Vítor Gaspar respostas negativas para mitigar o aumento de impostos, e estará alerta (e incomodado ou em linguagem de atleta, exausto) com o resultado.
A tarefa do 30º km não será fácil mesmo no excel. Para 2013 estão orçamentados 78 mil milhões de euros de despesa. De acordo com o relatório do OE, serão gastos 37,6 mil milhões em prestações sociais e as chamadas funções sociais (Educação, Saúde, Segurança, habitação e serviços culturais) têm um peso de 28,4 mil milhões. Reduzir quatro mil milhões sem cortar nestas áreas parece ser uma tarefa impossível e que o governo não esconde. “O sistema político português não foi capaz até hoje de apresentar uma associação entre as funções sociais que são fundamentais (Educação, Saúde e protecção social) e os respectivos custos” e por isso “é preciso adequar as funções àquilo que a sociedade portuguesa e o sistema político português são capazes de forma sustentável financiar”, disse Gaspar. Por outras palavras, as de Passos, “o Estado só deve fazer aquilo que faz bem e deve fazer muito melhor aquilo que não pode deixar de fazer”. O que é?

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