quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Factura da água aumentou até ao triplo entre 2009 e 2011 - Economia - PUBLICO.PT

Factura da água aumentou até ao triplo entre 2009 e 2011 - Economia - PUBLICO.PT

Operadores estão cada vez mais a ajustar os preços do abastecimento, saneamento e tratamento de resíduos de modo a conseguir cobrir os reais custos desses serviços.

A factura da água aumentou na esmagadora maioria dos concelhos do país nos últimos dois anos, chegando a triplicar nalguns casos. Dados da Entidade Reguladora para os Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR) mostram que os preços nos diferentes pontos do país aproximaram-se ligeiramente, mas ainda há uma grande disparidade.

Em 2011, segundo o último levantamento da ERSAR, uma família típica pagou pela factura da água em média 19,11 euros mensais. Este valor pressupõe um consumo de 10 metros cúbicos de água por mês e inclui os serviços de abastecimento (9,80 euros), saneamento (5,69 euros) e tratamento de lixo (3,62 euros).

Mas a variação no país é grande. O valor máximo foi cobrado pela Infralobo, empresa detida em 51% pela Câmara de Loulé e que serve o empreendimento turístico de Vale do Lobo e algumas urbanizações e moradias vizinhas. Os moradores pagaram 40,52 euros por mês (14 euros para a água, 20,10 euros para o saneamento e 6,42 euros para os resíduos). A seguir na lista está uma empresa municipal semelhante, também de Loulé, a Infraquinta, que serve a Quinta do Lago. Preço da factura típica: 40,16 euros.

No outro extremo estão concelhos como Terras de Bouro (2,53 euros), Penedono (2,60), Oleiros (3,30), Cinfães (4,40) e Belmonte (4,45). As facturas mais baratas têm em comum o facto de não integrarem todos os serviços. Segundo a ERSAR, de todos os concelhos de Portugal continental, 17 não cobram pelo saneamento e 15 não facturam também o tratamento dos resíduos sólidos.

Na prática, muitos concelhos continuam a subsidiar o preço da água. Mas houve alguma aproximação nos preços. Em 2009, data do último balanço das tarifas feito pela ERSAR, havia uma relação de 1 para 21 entre a factura mais barata e a mais cara. Agora, esta relação é de 1 para 16. No abastecimento de água em si, a relação, que era de 1 para 30, está agora em 1 para 14.

"A tendência é positiva", afirma Jaime Melo Baptista, presidente da ERSAR. Segundo Melo Baptista, esta aproximação em parte resulta de uma recomendação tarifária de 2009 da entidade reguladora, e em parte da necessidade das próprias entidades gestoras em recuperarem os custos que têm para distribuir a água, tratar os esgotos e recolher o lixo.

Mesmo com um preço económico para as populações, os operadores "em baixa" - câmaras, serviços municipalizados, empresas municipais, concessões privadas - enfrentam custos menos flexíveis na água e nos serviços que compram dos operadores "em alta", que gerem as barragens, estações de tratamento e unidades para receber o lixo. "É óbvio que há uma crescente preocupação com a recuperação dos custos", diz Melo Baptista.

Maioria com aumentos
Os dois factores somados resultaram em elevados aumentos na conta da água entre 2009 e 2011. Em muitos casos, os preços eram tão baixos que as subidas, em termos percentuais, atingiram taxas enormes. A Câmara de Sardoal, por exemplo, cobrava em 2009 uma média de 6,05 euros para um consumo mensal de dez metros cúbicos de água. Agora, a factura disparou para 20,05 euros - ou seja, mais do que triplicou. A autarquia explica que não conseguia mais arcar com as tarifas baixas e simplesmente seguiu a recomendação tarifária da ERSAR (ver caixa).

Dos 254 concelhos de Portugal continental para os quais a ERSAR tem dados completos, 213 (77%) subiram os preços desde 2009; 109 (43%) tiveram aumentos superiores a 25%. Desses, 65 subiram a factura entre 25% e 50%, 26 de 50% a 100% e em 18 acima de 100%. Dois mais do triplicaram o preço.

Jaime Melo Baptista chama a atenção para o facto de alguns destes aumentos reflectirem uma realidade anterior em que as facturas eram muito baixas e integravam apenas o abastecimento de água em si. Adicionar os custos do saneamento, por exemplo, foi o que fez disparar agora as facturas no concelho de Meda. "Tem havido uma maior convergência das águas residuais com a água de abastecimento", diz Melo Baptista.

A ERSAR quer agora balizar o aumento dos preços com um novo tipo de informação ao consumidor. A entidade reguladora pretende lançar, até ao final do ano, um sistema de 16 indicadores de eficiência dos serviços prestados - como perdas de água na rede ou o consumo de energia - que será divulgado publicamente, com base num código de cores verde-amarelo-vermelho. Os dados principais já foram recolhidos e neste momento estão a ser realizadas auditorias a 386 operadores em todo o país.

Um dos indicadores - o da acessibilidade económica, que combina o valor das tarifas com o rendimento das famílias - vai permitir avaliar melhor em que circunstâncias se justifica subsidiar a factura da água. O ideal será se o preço da água representar até 0,5% do orçamento doméstico. Acima de 1,0%, é um ónus demasiado pesado.

O objectivo dos indicadores não é apenas informar os consumidores, mas também avaliar se os aumentos na factura estão a cobrir custos que poderiam ser evitados com uma melhor gestão. "Vamos ter mais capacidade de interpelar os operadores", avisa Melo Baptista.


Contas desiguais: exemplos da disparidade

Terras de Bouro tem a água mais barata
Terras de Bouro, no distrito de Braga, tem a água mais barata do país. O custo baixo de 2,53 euros, por dez metros cúbicos por mês, é justificado pelo "compromisso assumido com a população", segundo o presidente da Câmara Municipal, Joaquim Cracel. "As pessoas têm muitas dificuldades financeiras e, por agora, o município tem capacidade para suportar os custos", afirma. Isto permite que na factura dos consumidores não haja custos na parte dos resíduos. Contudo, Joaquim Cracel admite que daqui a um ano será proposto à Assembleia Municipal um aumento no preço do abastecimento, de dez cêntimos por metro cúbico.

Covilhã e os custos da orografia
A Covilhã impõe uma das facturas de água mais caras do país (31,59 euros), devido aos elevados custos da aquisição e tratamento da água e do saneamento. José Calmeiro, presidente do conselho de administração das Águas da Covilhã, garante que "a empresa responde a 100% da área do concelho, apesar de ter uma orografia difícil" e acrescenta que isso acarreta "custos completamente diferentes" em relação a outros municípios. A barragem da Cova do Viriato atende a algumas necessidades da população, mas é insuficiente. Por isso, está em cima da mesa a construção de uma nova barragem e, nessa altura, "os custos vão baixar".

Vila Viçosa preocupada com a população

Vila Viçosa, no Alentejo, utiliza um sistema de auto-gestão, desde a captação até ao tratamento da água. O mecanismo permitiu uma redução na factura de 28% entre 2009 e 2011, mas tem inconvenientes como a impossibilidade de candidaturas ao QREN. O vice-presidente da câmara municipal, Ricardo Barros, confessa que a autarquia acaba por perder dinheiro. "Mas nesta altura de crise, é nossa obrigação social termos esta atitude perante os consumidores", diz.

Em Sardoal e Sernancelhe preços disparam

As populações do Sardoal, em Santarém, e de Sernancelhe, em Viseu, enfrentaram uma subida de preços de 231% e 177% entre 2009 e 2011, respectivamente. A mudança deveu-se à actualização de tarifários recomendada pela ERSAR - a entidade reguladora do sector. O preço da água em si mais do que duplicou e foi introduzido na factura o custo do saneamento. Miguel Borges, vice-presidente da Câmara Municipal do Sardoal, revela que durante muitos anos os munícipes beneficiaram de uma factura baixa. "Mas chegámos a um ponto em que não conseguíamos mais", refere. Ainda assim, a câmara tem tarifas reduzidas para famílias carenciadas e numerosas. Maria José Lopes, técnica superior da Câmara Municipal de Sernancelhe, explica, por sua vez, que "foi um grupo de economistas que fez um estudo para implementar os novos preços". Em ambos os casos, as taxas actuais são para manter e estarão apenas sujeitas a correcções em função da inflação.

Vale do Lobo vítima da sazonalidade
Os elevados custos do preço da água em Vale do Lobo, em Loulé, são justificados com a sazonalidade. O empreendimento turístico, diz Aquilino Pereira, administrador da Infralobo - a empresa municipal que gere as infra-estruturas -, "tem de manter todos os serviços e equipamentos, como qualquer cidade, durante todo o ano, mas só no Verão é que funciona em pleno". O preço da água por metro cúbico, sublinha Aquilino Pereira, é o mesmo que é pago em todo o concelho de Loulé, mas ao valor base juntam-se as componentes fixas (previstas na lei) para fazer face às despesas.

Aquilino Pereira lembra ainda que há "um preço a pagar pela excelência que tem de ser mantida todo o ano". "[Nos meses de Julho e Agosto], facturamos mais de metade do valor que é cobrado em todo o ano, mas nos outros meses a exploração é deficitária", acrescenta. Na Quinta da Lago, também em Loulé, a situação é idêntica. Neste aldeamento, a factura da água equivalente a uma família típica é de 40,16 euros, ligeiramente inferior à do Vale do Lobo, que é 40,52 euros.

Albufeira: factura triplica mas não chega
No concelho de Albufeira, o custo dos encargos relacionados com o abastecimento de água, recolha do lixo e tratamento de esgotos praticamente triplicou entre 2009 e 2011, saltando de 6,30 euros/mês para 19,15 euros, para um consumo de dez metros cúbicos. O presidente da câmara, Desidério Silva, justifica: "Procuramos aproximar o preço aos custos de exploração, mesmo assim não paga a despesa." O autarca, neste caso, também encontra explicação na sazonalidade. "Temos de manter infra-estruturas operacionais para uma população que triplica nos meses de Verão, e isso tem um preço que não é reconhecido pela administração central." O que o município recebe das transferências do Orçamento do Estado, cerca de 4,2 milhões de euros, "apenas dá para pagar a limpeza da cidade".

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