quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Farmacêuticos queixam-se da burocracia do sistema, que consideram desfasado da realidade, e acusam de contribuir para prejuízos crescentes. Organismo que confere facturas no SNS chega a não pagar por má impressão no médicoFarmácias. Estado retém mais de um milhão de euros por erros de facturas | iOnline

Farmácias. Estado retém mais de um milhão de euros por erros de facturas | iOnline

Farmacêuticos queixam-se da burocracia do sistema, que consideram desfasado da realidade, e acusam de contribuir para prejuízos crescentes. Organismo que confere facturas no SNS chega a não pagar por má impressão no médico.

Isaura Martinho é uma das farmacêuticas do país que esta semana receberam do centro que confere as facturas do SNS as receitas consideradas inválidas e que o Estado não aceita, por isso, pagar. Faz parte da rotina: o reembolso pelas comparticipações dos remédios num dado mês é antecipado ao dia 20 do mês seguinte pela Associação Nacional das Farmácias mas está sujeito a este ajuste. Entre as 21 receitas aviadas em Dezembro que agora recebeu de volta, uma é sintoma de um problema que os farmacêuticos dizem ser crescente: o sistema tornou-se rígido, até para detectar fraudes, mas penaliza as farmácias por erros que não são delas.
Em Dezembro, uma doente aviou na Farmácia Marvila, em Chelas, quatro remédios no valor de 33 euros. Pagou na hora 8 euros e o Estado comparticiparia os restantes 25. Agora a receita que permitiria a Martinho receber esse pagamento veio devolvida: o código de barras de um dos medicamentos não pode ser lido no Centro de Conferência de Facturas (CCF), na Maia. “Os números estão visíveis, podiam ter sido inseridos à mão, mas não o fizeram”, diz. Por causa de um problema no toner de uma impressora no Hospital de Santa Marta, não sabe se vai reaver o dinheiro, necessário para cobrir a despesa com os remédios. “A única forma de resolver é esperar que a doente cá volte e pedir- -lhe que quando voltar ao hospital peça ao médico uma nova receita.”
Os farmacêuticos reconhecem mais- -valias neste aperto do cerco à prescrição do SNS, até pelas situações de fraude, mas defendem que a relação tem vindo a tornar-se pouco compreensiva e por vezes persecutória. “Neste momento há cerca de 50 tipos de erros que podem levar à negação do pagamento da receita, muitos dos quais somos alheios. A ideia que temos é que o sistema visa sobretudo demorar o pagamento”, comenta outro farmacêutico. Se o volume de facturas devolvidas é oscilante, o mês de Dezembro fez disparar as queixas junto da ANF. Um problema que a associação está a tentar resolver com a tutela é o facto de o registo onde os médicos pesquisam os remédios a prescrever com produtos que não estão no mercado, como embalagens de diferentes quantidades. Isto faz com que se um farmacêutico prescrever a única embalagem disponível, para o doente poder levar o remédio, a receita venha devolvida. Se não o fazem, o utente tem duas soluções: ou volta ao médico ou paga o remédio na íntegra, situação pela qual muitos utentes têm vindo a optar, mas que para outros é incomportável, seja pelo dinheiro seja por precisarem do remédio. Em média a taxa de devolução de montantes facturados pelas farmácias ao SNS em Dezembro foi de 1,38%, o que significa que neste mês o CCF reteve mais de um milhão de euros.
Não havendo uma estatística geral para erros mais detectados, algumas farmácias servem de amostra: das 21 receitas que Martinho recebeu de volta, cinco foram erros seus, entre eles ter deixado passar receitas fora da validade. Muitas, contudo, resultam de um problema recente: revisões trimestrais de preços. “Não existe compreensão do que é lidar com preços que mudam constantemente e que podem mudar no intervalo de uma venda suspensa, em que o doente só traz a receita 15 dias depois. No intervalo o preço muda. Não é possível verificar tudo quando o nosso papel é estar ao balcão.”
Luís Cunha, director técnico da Farmácia Duque de Ávila, refere outros casos. Entre as 22 receitas que recebeu agora de volta há cinco em que a responsabilidade foi sua: faltarem, por exemplo, assinaturas. Em seis considera haver erro da parte do CCF: não entendeu, por exemplo, a dispensa de comprimidos num remédio que aparecia na receita passada ao doente sem código de barras mas dizia “blister” e 60 unidades. Se é possível contrapor as decisões, o processo é lento e por vezes implicaria mais gastos. “Vejo que tenho a haver 6 euros, será que compensa meter-me no carro para ir a um consultório pedir uma nova receita?”. Numa das receitas que Cunha recebeu esta semana de volta o organismo insiste que a farmácia dispensou mais 50% de medicamento do que o prescrito. “O CCF já admitiu o erro mas continua a devolver a receita. Posso continuar a enviar ou fazer uma reclamação, mas o tempo de resposta é de um ano e meio.” Esta semana recebeu respostas a reclamações feitas em Agosto de 2011: em 800 euros retidos nesse mês, o CCF reconhece direito a metade. “A sensação é de que existe alguma ignorância e incompetência, o que não se compreende sobretudo quando o sector teve cortes de 600 milhões nos último ano está numa situação em que as vendas normais já dão muitas vezes prejuízo.”

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