domingo, 15 de setembro de 2013

Europa deixou de ser modelo civilizacional para o mundo - Politica - DN

Europa deixou de ser modelo civilizacional para o mundo - Politica - DN

Democracia. Historiadores alertam que crise ameaça as democracias numa região onde "é catastrófico" haver uma geração condenada ao desemprego ou à emigração.

A Europa, refém das ideias dos últimos dois séculos que a apresentavam como modelo de valores universais ao resto do mundo, acelerou o seu processo de integração "voltar a ser o ator principal", explicou ontem o historiador britânico Mark Mazower.
A partir de 1989, com o fim da Guerra Fria e a unificação da Alemanha, "a Europa acordou e viu um mundo diferente com a globalização a avançar". Porém, a globalização mostrou que os Estados nação "já não serviam para resolver os problemas atuais" - e a crise "abalou a crença" de que a Europa é um fator de bem-estar e coesão social, alertou o especialista na Europa do século XX, no último dia do encontro "Presente no futuro", organizado em Lisboa pela Fundação Francisco Manuel dos Santos e subordinado ao tema "Portugal europeu. E agora?".
Acresce que os cidadãos passaram a "associar os partidos democráticos" à crise, a qual "está a pôr em causa a democracia" quando um partido nazi cresce tão depressa num país - a Grécia - que sofreu os horrores da Alemanha nazi. Certo, sustentou Mark Mazower, é que haver uma geração de jovens condenada ao desemprego ou à emigração "é catastrófico" para a Europa.
Outro historiador britânico, Antony Beevor, mostrou-se particularmente crítico com a falta de democraticidade na Europa - pois Bruxelas "parece agir" como se os eleitorados nacionais "devam ser poupados de tomar más decisões" - e com os líderes europeus dos últimos anos. "Os eurocratas não aprenderam nada" com os erros do passado, argumentou o autor de Estalinegrado.
Beevor acusou os responsáveis europeus de mentirem a si próprios, "incapazes de distinguirem entre os ideais políticos e a realidade, viciados em pensar apenas no curto prazo e sem coragem para falar a sério das coisas sérias" e de terem "medo dos media e dos mercados".
Quanto ao euro, Antony Beevor considerou que os líderes europeus devem reconhecer que uma Europa unida com uma moeda única "foi um sonho perigoso".
Partidos políticos
O papel dos partidos portugueses na saída da crise em que o País vive também foi particularmente criticado, com os intervenientes a mostrarem uma enorme descrença na sua capacidade de estarem à altura dos acontecimentos.
"Temos de pensar menos o envelhecimento como um custo e mais como um mercado e como uma oportunidade de empreendedorismo. Mas, se também isso depender do sistema e da classe política, é certo que nunca teremos aquilo de que precisamos", sustentou o sociólogo Manuel Villaverde Cabral, concluindo: "Não está escrito que em Portugal têm de ser estes partidos" a governar.
António Barreto, presidente da fundação organizadora, revelou igualmente profundo ceticismo com os partidos, questionando-se sobre quem vai avaliar, decidir e monitorizar a aplicação dos fundos comunitários dos próximos anos - e assim "determinar a linha para o Estado democrático do futuro".
Augusto Mateus, ex-ministro e responsável pelo estudo sobre os "25 anos de Portugal europeu", deixou também um alerta quanto à utilização dos novos fundos: ao contrário do que se fez até agora, essas verbas têm de ser concentradas em duas dezenas de projetos no máximo.
Noutro painel, sobre "Como somos representados na UE?", o embaixador Francisco Seixas da Costa fez um balanço positivo da forma como os interesses do País foram defendidos dentro da União nos últimos anos - sendo certo que, face à redução da influência dos pequenos e médios países e à perda de poderes da Comissão, "este era o momento" para Portugal "mostrar uma política europeia a sério".
Ficar ou sair do euro
Um assunto dominante nos trabalhos do último dia do encontro "Presente no futuro" foi o do futuro da moeda única e o da continuidade de Portugal nesse núcleo duro da União. Enquanto Paulo Trigo Pereira previu a saída dos países europeus periféricos do euro, por ser uma "moeda demasiado forte" para as respetivas economias, outros dois economistas divergiram sobre a continuidade de Portugal no euro - sendo que 90% dos presentes no debate votaram nesse sentido.
João Ferreira do Amaral defendeu a saída de Portugal do euro porque tem três problemas estruturais irresolúveis com a moeda única: a distorção da sua estrutura produtiva, a "redução drástica" na produção de bens transacionáveis e o envelhecimento.
José Pena do Amaral considerou essa hipótese inviável, face às implicações decorrentes - apenas - de se saber que Portugal estaria a negociar essa solução: haveria uma "corrida aos depósitos, fecho de fronteiras, controlo de capitais, o Exército na rua...". Os custos também seriam tão negativos para a UE, que, por alguma razão, a Alemanha assumiu (nas vésperas de eleições) que a Grécia precisará de novo resgate, adiantou.

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