Um em cada nove portugueses já vive na costa e o número de pessoas
e de edifícios continua a subir apesar dos riscos das alterações
climáticas e da erosão costeira.
Na praia da Vagueira, a construção
continua a crescer: a erosão já obrigou à reposição de areia e à
construção de uma espécie de paredão Paulo Pimenta Portugal tem cada vez mais pessoas e edifícios junto ao mar, apesar
dos problemas actuais de erosão costeira e dos riscos futuros das
alterações climáticas. O número de habitantes nas freguesias do país que
confinam com a costa aumentou cerca 68% entre 1970 e 2011, de 738 mil
para 1,2 milhões de habitantes. Na prática, um em cada nove portugueses
vive na costa.
A presença de edifícios saltou de 254 mil unidades em 1970 para 855 mil em 2011. Mais da metade – 490 mil – está desocupada.
Os
números são avançados por um estudo de investigadores do Instituto de
Ciências Sociais e da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa,
que avalia a realidade e as consequências da ocupação crescente da faixa
litoral.
Não é novidade que a população concentra-se cada vez
mais na faixa litoral. O trabalho, no entanto, dá elementos mais
precisos sobre o microcosmo das freguesias costeiras, que é onde está a
população que sente na pele os efeitos da erosão. É o fenómeno da
“costerização”, conforme classifica a socióloga Luísa Schmidt,
coordenadora do estudo Change-Mudanças Climáticas, Costeiras e Sociais,
cujos resultados serão apresentados segunda-feira numa conferência na
Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa. “As pessoas abeiraram-se mais
da costa”, afirma Schmidt.
Esta tendência vem do passado,
acentuou-se a partir da década de 1970 e não dá sinais de abrandar.
Entre os dois últimos censos – 2001 e 2011 – a população junto à costa
aumentou 10%.
Para exemplificar o que é que este movimento
significa, em termos de riscos, o estudo abordou três situações
particulares: Vagueira, na região de Aveiro; Costa da Caparica, na Área
Metropolitana de Lisboa; e Quarteira, no Algarve. Todas enfrentam fortes
problemas de erosão. Na Vagueira, o mar avançou 26 metros entre 2002 e
2010. Ainda assim, a população cresceu 20% desde 1991 e o número de
edifícios subiu 28%.
Costa da Caparica a ceder espaço ao mar
Na
Costa da Caparica, a linha de costa também está a ceder espaço ao mar.
Nalguns pontos, como a Cova do Vapor, o ritmo médio é de 26 metros por
ano. Mas explodiu o número de habitantes (94%), de edifícios (44%) e de
alojamentos sazonais (60%) nas últimas duas décadas. E em Quarteira, a
população duplicou, os alojamentos aumentaram 74%, mas todos os anos
perdem-se seis metros de terra para o mar, em média.
Inquéritos
conduzidos pelo estudo nestas três localidades mostram que a erosão
costeira preocupa os moradores. Na Vagueira, mais de 80% dos inquiridos
diz que a erosão é um problema grave e que vai piorar no futuro.
Mas
poucos habitantes parecem dispostos a procurar outro sítio para viver.
Nos três locais, a grande maioria dos inquiridos quer que seja feito
de tudo – esporões, quebra-mares, paredões e enchimento artificial de
praias – para manter a costa como está e proteger os seus imóveis. Uma
proporção minoritária – que não chega a 30%, na Costa da Caparica –
concorda que os edifícios é que têm de ser mudados para outro lado. “As
pessoas acham que deve se manter tudo como está”, conclui Luísa Schmidt.
O
que está lá é para ficar, mas não há espaço para mais ninguém. A
maioria dos habitantes das três localidades – de 73% a 89% – diz “não” à
construção de novos edifícios junto à costa.
Alterações climáticas
Um
relatório publicado na quinta-feira, dia 22, pela Agência Europeia do
Ambiente alerta para possíveis efeitos das alterações climáticas nas
zonas costeiras. O relatório cita o aumento previsto no nível médio do
oceano e a maior frequência de episódios de sobrelevação do nível do mar
devido ao mau tempo como principais factores que agravarão o problema
da erosão.
Este cenário poderá aumentar a factura que o país paga
para proteger as populações mais próximas do mar. Nos últimos 20 anos,
segundo o projecto Change, foram investidos cerca de 200 milhões de
euros na defesa do litoral contra o avanço do mar.
Os resultados
do inquérito revelam uma disparidade de resultados quanto à confiança
das populações no que tem sido feito para resolver os problemas do
litoral. Na Costa da Caparica, três quartos dos inquiridos não confia na
actual gestão costeira. Mas na Vagueira e na Quarteira, a proporção é
menor (42% e 31%).
Já a confiança nas instituições aparece
definitivamente em baixa. O Ministério do Ambiente, por exemplo, é visto
por quase metade dos inquiridos como uma entidade com “muito poder” nas
questões do litoral, mas apenas 20% atribuem-lhe “muita confiança”.
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