O sistema de cobrança de multas aos utentes que não pagam as taxas moderadoras nos hospitais e centros de saúde de todo o país está por implementar há quase um ano. Na prática, quem não paga as taxas não está a ser sancionado por isso – uma situação que leva a que muitos milhões de euros daquelas taxas e respectivas coimas continuem por cobrar, prejudicando as contas dos estabelecimentos de saúde.
A denúncia sobre as falhas neste processo é feita pela Inspecção-geral das Actividades em Saúde (IGAS), que no seu relatório de 2012, a que o SOL teve acesso, alerta para o facto de os estabelecimentos terem mesmo ordens do Ministério da Saúde para estarem parados. Ou seja, as unidades de saúde receberam indicações para não enviarem informação sobre os utentes infractores para a Administração do Sistema Central do Sistema de Saúde (ACSS).
Segundo o decreto-lei de 21 Junho de 2012 (que introduziu as multas), cabe à ACSS o levantamento do auto e a extracção da certidão de dívida. Esta tem de ser enviada depois às Finanças, para a Autoridade Tributária e Aduaneira, a quem compete cobrar a multa aos utentes que continuem sem pagar a taxa dez dias depois de terem recebido a notificação.
Há mais utentes a dever
No relatório, a IGAS adianta que está a aumentar o número de utentes que não pagam a taxa e que muitas unidades não conseguem controlar os valores em dívida. «É grave. O Governo anunciou medidas para aumentar a cobrança efectiva das taxas, mas actualmente o sistema de multas está em stand by», confirmou ao SOL fonte do conselho de administração de um grande hospital do país. A mesma fonte acrescenta que, tendo em conta o grande número de utentes que não paga as taxas, quando entraram em vigor as regras das contra-ordenações, em Junho de 2012, os hospitais enviaram as situações de dívida para a ACSS. «Mas, como não havia sistema, a enorme quantidade de casos deve ter entupido a ACSS que pediu para se parar de mandar informação».
Segundo a IGAS, os serviços de saúde receberam, a 26 de Junho de 2012, uma circular informativa da ACSS a pedir a todas as unidades do Serviço Nacional de Saúde para se «absterem do envio para a ACSS de quaisquer elementos enquadrados neste âmbito».
Fonte oficial deste organismo confirmou ao SOL que o processo está atrasado, prometendo a sua implementação para «breve». Segundo a ACSS, o atraso resulta da «necessidade de envolver a SIBS» (que gere o serviço de multibanco) no processo de pagamento de taxas «à saída da unidade de saúde e também na cobrança de multas por parte da Autoridade Aduaneira».
A multa a aplicar aos utentes é, no mínimo, cinco vezes o valor da taxa moderadora em dívida, e nunca pode ser inferior a 30 euros. No máximo, poderá atingir 250 euros, ou seja, o «quíntuplo do valor mínimo da coima», segundo define o decreto-lei de Junho de 2012.
«A verdade é que este atraso leva a que os hospitais não tenham as receitas que podiam ter» – alerta fonte hospitalar, lembrando que, além de não poderem contar com o dinheiro das taxas moderadoras, os estabelecimentos de saúde não estão a receber igualmente o valor das multas que serão distribuídos entre os hospitais, a ACSS e o Fisco.
Receita de 33,6 milhões de euros
Segundo as estimativas do Orçamento do Estado para este ano, o Governo espera uma receita de 33,6 milhões de euros com a cobrança de taxas moderadoras. Segundo o relatório da IGAS, no primeiro semestre de 2012 os centros de saúde cobraram 23 milhões de euros em taxas moderadoras, mais 12 milhões do que no semestre anterior.
Mas a verdade é que são muitos os milhões que ficam por pagar. Em 2011, por exemplo, as dívidas ultrapassaram os 50 milhões. E um estudo, em 2010, verificou que 1,4 milhões de utentes que têm condições económicas não pagavam a taxa.
O Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos garante, porém, que o Fisco está já a cobrar aos utentes o pagamento das taxas em falta. À Lusa, o presidente deste organismo admitiu, no entanto, que ainda não começou a cobrança das multas: «Neste momento é a taxa, posteriormente vem a coima», disse no mês passado.
O atraso na cobrança pode levar a que muitas multas prescrevam entretanto. É que a lei estipula que o pagamento das taxas só pode ser exigido pelo Fisco nos três anos seguintes à prestação dos cuidados de saúde, prescrevendo decorrido esse prazo.
Estas regras – que possibilitam que as Finanças façam também penhoras aos utentes – só se aplicam aos cuidados de saúde prestados a partir de 1 de Janeiro de 2012. Nesse ano, as taxas moderadoras foram alteradas, passando a custar o dobro do valor cobrado em 2011. E em Janeiro último, voltaram a aumentar, sendo actualizadas automaticamente à taxa de inflação relativa ao ano civil anterior (2,8%).
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